ARTIGO – Avanço digital no Direito:As Inovações tecnológicas na execução civil

Na era da informação digital, as fronteiras entre a justiça tradicional e a inovação tecnológica tornam-se cada vez mais tênues. Com o crescimento exponencial da tecnologia e a consequente demanda por uma justiça mais ágil e assertiva, ferramentas eletrônicas integradas têm revolucionado o campo da execução civil no Brasil. Essas plataformas, combinando vastos repositórios de dados com algoritmos sofisticados, não apenas aceleram a localização de bens de devedores, como também elevam a efetividade dos processos judiciais. Para credores, advogados e magistrados, essa revolução não apenas traduz-se em maior celeridade, mas também em uma significativa ampliação da satisfação e confiança no sistema judicial. Neste cenário, entender a magnitude e os desdobramentos desse avanço torna-se não apenas relevante, mas essencial para qualquer profissional ou entusiasta do Direito.

Quando o Estado tomou para si o monopólio da força, retirando do particular a possibilidade, por desforço próprio, de fazer valer seus direitos, assumiu também o dever – e com natureza fundamental – de tutelar os direitos dos indivíduos quando ameaçados ou violados, o que significa dizer, em outras palavras, que a solução dos conflitos entre indivíduos e entre estes e o próprio Estado constitui uma das funções estatais: função jurisdicional, tipicamente desempenhada pelo Poder Judiciário, composto por tribunais e juízes, que somente podem agir mediante provocação da parte, a quem é assegurado o direito fundamental de ação (art. 5º, XXXV, CF).

Ocorre que a prestação jurisdicional – resposta do Estado ao chamado do interessado em ver tutelado seu direito – precisa ser efetiva e não pode se dar de qualquer forma, seja porque seria esvaziar o referido direito de ação caso a reação estatal carecesse de efetividade (de que adiantaria disponibilizar ao indivíduo o direito fundamental de acionar o Judiciário, se não houvesse correspondente dever do Estado em dar uma resposta efetiva?), seja pela própria fundamentalidade do direito de ação, tida por alguns como o mais fundamental de todos, pois é aquele dedicado a efetivar todos os demais direitos em situação de ameaça ou violação.

Especificamente para o caso de obrigações contratuais descumpridas, a exemplo de pagamentos, entrega de bens móveis ou imóveis e execução de serviços, o Direito coloca à disposição do interessado o processo de execução, com o escopo precípuo de alcançar o cumprimento forçado da obrigação em favor do credor.

Tradicionalmente, o mecanismo de execução delineado pela legislação brasileira tem sido percebido como inadequado e insatisfatório para assegurar uma prestação jurisdicional eficaz. Em muitos casos, em vez de facilitar a justiça, ele tem aberto espaço para que o devedor utilize estratégias variadas, sejam elas processuais ou não, e táticas astutas para postergar e, assim, escapar do cumprimento de suas obrigações.

Em resposta a essas questões, o Código de Processo Civil (Lei 13.105/2015), em vigor desde março/2016, introduziu uma variedade de medidas inovadoras destinadas a combater a mencionada ineficiência do processo executivo. Dentre essas inovações, está a autorização ao magistrado para aplicar medidas executivas não convencionais com o intuito de pressionar o devedor ao cumprimento de suas obrigações. Isso inclui ações como a suspensão da Carteira Nacional de Habilitação, retenção de passaporte e bloqueio de cartões de crédito, entre outras.

Além das inovações legislativas, o cenário jurídico tem presenciado uma verdadeira revolução tecnológica, cujas implicações no processo de execução são vastas e profundamente transformadoras. Estas ferramentas, sobretudo na árdua tarefa da busca patrimonial, têm catalisado uma prestação jurisdicional mais eficaz e dinâmica no contexto da execução. O Sisbajud, sucessor do Bacenjud, funciona como uma ponte entre o Judiciário e as instituições financeiras, facilitando o bloqueio de ativos financeiros de devedores. O Renajud, por sua vez, é uma plataforma que conecta o sistema judiciário aos registros de veículos, permitindo imposições de restrições e bloqueios. O Infojud dá acesso às declarações de imposto de renda, proporcionando uma visão detalhada do patrimônio declarado de uma parte.

A evolução não para por aí. Recentemente, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) lançou o Sistema Nacional de Investigação Patrimonial e Recuperação de Ativos (Sniper), que surge como uma plataforma integrada, cruzando diversas bases de dados para localizar bens e ativos de devedores de forma mais assertiva. O CNIB (Central Nacional de Indisponibilidade de Bens) é um sistema que permite a consulta e a averbação de ordens judiciais sobre bens, garantindo que estes não sejam transferidos ou vendidos durante o processo. O SIMBA (Sistema de Investigação de Movimentações Bancárias) para consulta a depositantes de valores em contas e pagadores de faturas de cartões de crédito do devedor, o que poderia auxiliar na identificação de “laranjas”. Por fim, o CCS-Bacen (Cadastro de Clientes do Sistema Financeiro Nacional) é uma ferramenta do Banco Central que fornece informações sobre onde uma pessoa física ou jurídica possui contas, facilitando a localização de ativos.

Estas inovações, em conjunto, estão redefinindo a maneira como a execução é conduzida no Brasil, tornando-a mais ágil e eficiente. Neste contexto em constante evolução, torna-se imperativo que o advogado esteja adequadamente preparado e atualizado, de modo a aproveitar ao máximo as potencialidades destas ferramentas e garantir a melhor representação de seus clientes.

Fabrício de Farias Carvalho é advogado e professor de Direito Processual Civil em nível de graduação e pós-graduação (UNIFSA). Mestre e doutor em Direito Processual Civil. Diretor de Pesquisa e Pós-Graduação da Escola Superior da Advocacia – ESA/PI. Autor de artigos e livros jurídicos na área.

E-mail: [email protected]

 

Imagem:Arquivo Agência Brasil/Divulgação

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