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Falta de prazo para ressarcir erário gera insegurança jurídica, dizem especialistas

Na quarta-feira (8/8), o Plenário do Supremo Tribunal Federal decidiu que não há prazo para cobrar na Justiça dinheiro público desviado de forma dolosa. Por 6 votos a 5, os ministros decidiram que as ações que pedem ressarcimento aos cofres públicos por atos de improbidade administrativa cometidos de forma intencional não prescrevem.

A decisão tem repercussão geral, ou seja, valerá para todos os casos semelhantes que tramitam nas instâncias inferiores — cerca de mil processos.

Especialistas ouvidos pela ConJur afirmam que a tese de imprescritibilidade das ações dolosas de improbidade administrativa não está alinhada com a ordem democrática constitucional e gera insegurança jurídica.

Para o especialista César Alckmin Jacob, sócio do Duarte Garcia, o texto da Constituição Federal não permite a conclusão pela imprescritibilidade.

“E basta rever a sessão para notar que os ministros que alteraram o voto estavam lastreados nos argumentos do Ministério Público segundo os quais o reconhecimento da prescrição impediria o combate à corrupção. Os argumentos apresentados foram muito mais políticos e fundados num suposto princípio de que a moralidade administrativa deve ser buscada sempre e a qualquer custo. Como se o prazo de cinco anos não fosse mais que suficiente para se colherem elementos para uma ação de improbidade”, afirma.

Jacob lembra ainda que o relator, ministro Alexandre de Moraes, ponderou que a tese por ele proposta previa o início do prazo apenas a partir do conhecimento do fato, a impedir que sejam premiadas a morosidade e a incompetência dos agentes da persecução.

“A tese vencedora reconhece que as ações de ressarcimento poderão ser propostas a qualquer momento, mesmo que prescrita ação de improbidade. Segundo se extrai dos debates, esses pedidos serão veiculados em ações civis pelo procedimento ordinário, como, aliás, tem sido a praxe nos casos em que a prescrição das demais sanções da lei de improbidade se verificou.”

Para o advogado, muitas questões práticas ainda não foram definidas. “Por exemplo, na sessão, alguns defenderam que o Ministério Público não terá legitimidade para essa ação de ressarcimento, mas apenas o órgão prejudicado, como a administração direta, empresa pública. Na prática, todavia, o MP costuma mover essas ações. Outro ponto que fica indefinido: qual o grau de dolo que será exigido? Há corrente do STJ que entende que para a configuração dos atos de improbidade bastaria um ‘dolo indireto’. Isso é muito perigoso, pois pode gerar uma responsabilização objetiva dos agentes que não prescreverá”, destaca.

Thiago Turbay, do escritório Boaventura Turbay Advogados, também entende que a tese de imprescritibilidade das ações dolosas de improbidade administrativa não está alinhada com a ordem democrática constitucional.

“O Supremo perdeu a oportunidade de limitar o poder de punir e os abusos decorrentes. O Estado não pode eternizar ações judiciais sobre o pretexto de haver dificuldades estruturais, no tocante à cobrança de valores oriundos de ilícitos. Basta pensar o vetor contrário: se o particular for lesado em decorrência de ação estatal, haverá imprescritibilidade para ressarci-lo?”, questiona.

Segundo o tributarista e sócio da Bornholdt Advogados Geraldo Wetzel Neto, a questão envolvendo o prazo prescricional para ressarcimento de recursos desviados do erário em atos de improbidade deveria ser analisada com muita cautela.

“De um lado, temos que o prazo de cinco anos é deveras exíguo em alguns casos. Por outro lado, também não é possível defender a tese de que a responsabilidade não prescreve, pois isso gera enorme insegurança jurídica. Apenas para efeito de comparação, qualquer condenado no Brasil fica preso por no máximo 30 anos. Não seria justo que a responsabilidade financeira fosse além desse prazo. A solução me parece ser um equilíbrio entre esses prazos, eventualmente de forma a acompanhar a prescrição do próprio crime cometido.”

Já para Daniel Gerber, criminalista e professor de Direito Penal e Processual Penal, o que se premia com o posicionamento é a incompetência e lassidão da máquina estatal em agir no tempo adequado de seus interesses.

“Em primeiro lugar, jamais veríamos um particular perder um prazo de cinco anos na cobrança de seus créditos. Além disso, a operação ‘lava jato’ não pode continuar como um obstáculo para a concretização de postulados constitucionais. Não há que se falar em ressarcimento imprescritível, isso é norma constitucional.”

Para o ex-controlador-geral da União Jorge Hage, sócio da Hage, Navarro, Fonseca, Suzart & Prudêncio Consultoria em Compliance, o Supremo Tribunal Federal acertou na decisão. “O meu entendimento sempre foi pela imprescritibilidade. Isto é o que está na Constituição, com todas as letras. A decisão do STF foi fundamental para a continuidade do combate à corrupção. Decisão contrária seria um duro golpe”, diz.

Reviravolta
O julgamento da questão teve início na semana passada com o voto de oito ministros. Antes do reinício da análise, o Supremo havia formado maioriapara estabelecer um prazo para a ação. Na quarta-feira, porém, os demais ministros formaram maioria definitiva contra a prescrição.

Inicialmente, os ministros Luiz Fux e Luís Roberto Barroso haviam se posicionado pela prescrição. Durante o debate, no entanto, mudaram de ideia e votaram contra o prazo.

Fonte: Consultor Jurídico

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