ALGUMAS ALTERAÇÕES DA LEI 13.303/2016 NO ÂMBITO DAS EMPRESAS ESTATAIS

              Desde o dia 01 de julho de 2016 está vigorando a Lei n. 13.303/2016, também
denominada de Nova Lei das Estatais. A referida legislação trouxe profundas e
relevantes mudanças na regência das empresas públicas, das sociedades de economia
mista e de suas subsidiárias, no âmbito da União, dos Estados, do Distrito Federal e
dos Municípios. Como bem determinou o artigo 91 da Lei n. 13.303/2016, as empresas
públicas e as sociedades de economia mista constituídas anteriormente teriam o prazo
de dois anos para promover e se adequar às novas regras, passando então, a partir de
julho de 2018, a operar com as novas diretrizes impostas.

              Dentre tantas inovações, a Nova Lei das Estatais definiu critérios para a
escolha de membros do conselho de administração e cargos de diretoria, dando ênfase
à experiência e formação técnica para o exercício da função; reforçou o controle
interno das estatais, conferindo-lhe maior autonomia e independência por meio de
órgãos como o conselho fiscal, o comitê de auditoria estatutário e a auditoria interna.
Ademais, estabeleceu regras claras e objetivas para divulgação de informações, adoção
de práticas de gestão de risco, implementação de código de conduta, definição das
formas de fiscalização pelo Governo e pela sociedade, dentre tantas outras novidades.

               Obviamente que todo este aparato de mudanças trazidas pela Lei n.
13.303/2016 partiu da identificação de uma série de problemas: 1) a excessiva
discricionariedade no uso das empresas estatais para a realização de objetivos políticos;
2) a captura das empresas estatais, ou seja, a utilização destas estatais como mecanismos
de transferência de oportunidades de negócio para empresários ligados a políticos, 3) a
corrupção em si, com a utilização das estatais como fonte de renda para os políticos, 4) o
baixo índice de transparência e ausência de controle sobre o desempenho das estatais
quanto à execução de seus objetivos.

              Ponto que merece destaque e que será o foco desta análise é o tratamento que a
nova legislação dá ao processo licitatório. Se antes de ser sancionada a Nova Lei das Estatais, havia o já pacificado e consolidado entendimento de que as Empresas Públicas
e Sociedades de Economia Mista deveriam observar a Lei n. 8.666/1993 (Lei de
licitações), agora definido nos artigos 28 a 84 o tradicional regime de licitações restou
excluído do âmbito das Estatais, tudo com vistas à simplificação do processo licitatório
para as empresas públicas e sociedades de economia mista. Ocorre que a Lei n.
13.303/2016, ao regulamentar o artigo 173, §1º da Constituição Federal, extrapolou o
conteúdo do dispositivo constitucional, fixando as novas regras de licitação para toda e
qualquer empresa estatal, independentemente de seu objeto. Vale lembrar que algumas
dessas estatais, quando desenvolvem atividade econômica, operam em um ambiente
extremamente competitivo, cenário em que os rigores e formalidades do direito público
muitas vezes se mostram inadequados e dispensáveis.

                Diante desses aspectos, entendeu-se que a lei de licitações vigente, cujo texto
não faz distinções entre as particularidades dos órgãos públicos, sejam eles da
administração direta ou indireta, não satisfaz os anseios de diversas estatais, cujo fim é
prestar um serviço com qualidade e atingir seus objetivos, que tem como meta
acompanhar as inovações tecnológicas buscando fazer mais e melhor. Com a lei 8.666/93,
os procedimentos licitatórios são formalistas em excesso e representam um atraso, pelo
exagerado número de fases a serem seguidas por licitados. Assim, por meio da Lei n.
13.303/2016, teria sido concebido um regime próprio de licitações e contratos, com regras
mais flexíveis, a fim de garantir às estatais uma maior competitividade com as demais
empresas privadas, sem, todavia, infringir os princípios do direito administrativo.

                 Por outro lado, a lei de licitação, ao determinar no seu conteúdo a aplicação de
normas gerais para o processo de licitação, colide frontalmente com com a orientação do
artigo 22 inciso XXVII da Constituição Federal de 1988, que determina ser competência
privativa da União legislar sobre normas de licitação. Percebe-se, ainda, como orienta o
artigo 173 § 1º inciso III da CF/88, que para as empresas estatais deverá ser criada uma
lei específica que viabilize o processo licitatório nas mesmas, confirmando assim, que a
lei 8.666/93 não atende às expectativas das instituições que têm uma ligação com o
mercado econômico.

                  Conclui-se, pois, que o Estatuto jurídico das empresas estatais, que veio a
disciplinar o art. 173, § 1º, da CF, inovou o ordenamento jurídico, vez que trouxe,
explicitamente, em seu texto, casos de não incidência do processo licitatório, tais como a
comercialização de produtos e o estabelecimento de parcerias comerciais, todavia, tal inovação não foi tão ampla como poderia ser, não abrangendo todos os casos que podem
levar ao afastamento do regramento licitatório.

                   De igual modo, a jurisprudência do Tribunal de Contas da União (TCU), apesar
de admitir a inaplicabilidade de licitação, possui requisitos que nem sempre se fazem
presentes em concentrações que, por sua complexidade e peculiaridades, não devem se
sujeitar aos ditames da lei 13.303/2016 no que concerne à exigência de prévia licitação.
Por outro lado, entende-se que o ônus de ser uma empresa estatal, com a existência de
recursos públicos em sua constituição e, em alguns casos, sua manutenção, acaba por
trazer argumentos à liberdade empresarial, tais como a imposição de licitação no maior
número de casos possíveis como mecanismo de atendimento dos princípios da
impessoalidade e da moralidade, bem como para evitar abusos e desvios na condução da
empresa estatal.

                     Em análise, foi possível observar a tensão constante que paira em contratações
em que não é claro se a regra licitatória deve incidir ou não, prevalecendo o entendimento
de que, em concentrações complexas, a flexibilidade empresarial deve sobrelevar à
licitação, desde que os princípios constitucionais sejam respeitados, em especial a
vantajosidade e economicidade. No caso das hipóteses de não incidência de licitação,
tratadas na lei 13.303/2016, na jurisprudência e na doutrina, devem ser vistas como
exemplificativas, devendo prevalecer a flexibilidade empresarial, com uma maior
desburocratização e afastamento do regramento licitatório sempre que o rito licitatório
venha a comprometer, direta ou indiretamente, o alcance dos objetivos sociais da empresa estatal.

Fábio André Freire Miranda

Especialista em direito processual, especialista em direito tributário e fiscal, mestre em Ciências Políticas.

Danyelle Furtado Freire Miranda

Especialista em auditoria contábil, bacharelanda em direito.

 

 

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