A interpretação da Lei de Improbidade Administrativa (Lei 8.429/1992) sofreu mudanças significativas com a introdução da Lei 14.230/2021, principalmente em relação ao artigo 11. Uma recente decisão da 1ª Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) trouxe luz a esse debate, ao derrubar uma condenação por improbidade administrativa de gestores que declararam a conclusão de uma obra pública em suas prestações de contas, mesmo estando incompleta.
A reclamação que levou à revisão da condenação foi ajuizada pela defesa de um dos acusados, representada pelo advogado Saulo Rondon Gahyva, do escritório Gahyva e Brandão Advogados. Os acusados haviam sido condenados com base no artigo 11, caput e inciso I, da Lei de Improbidade Administrativa em sua redação original, que tratava de atos ou omissões contrários aos princípios da administração pública de forma genérica.
Entretanto, a nova redação do artigo 11, introduzida em 2021, requer que seja especificada qual conduta listada nos incisos foi praticada pelo agente ímprobo, tendo o inciso I sido revogado. Diante dessa mudança, a 1ª Turma do STF entendeu que a conduta dos gestores não se enquadra em nenhuma das hipóteses previstas na nova redação da lei, invalidando assim a condenação por improbidade administrativa.
Essa decisão reflete a interpretação mais benéfica conferida pelo Supremo Tribunal Federal à nova Lei de Improbidade Administrativa, permitindo que casos como esse tenham seu trânsito em julgado postergado pela defesa. No entanto, o processo enfrentou uma longa jornada judicial: iniciado em 2002, só chegou ao STJ em 2013, onde não teve seu mérito analisado.
Apesar dos obstáculos processuais encontrados, a defesa persistiu, especialmente após a entrada em vigor da nova Lei de Improbidade Administrativa em outubro de 2021. Após aguardar a decisão do STF sobre a retroatividade da lei em agosto de 2022, o STJ manteve a condenação, baseando-se no caráter doloso da conduta, conforme apontado pelo TRF-1.
Contudo, a defesa não se deu por vencida e ajuizou uma reclamação constitucional, alegando que a decisão do STJ violava o entendimento do Supremo. O ministro relator Luiz Edson Fachin votou pela improcedência do pedido, mas a divergência aberta por Gilmar Mendes prevaleceu.
O voto vencedor destaca a importância de alinhar os regimes jurídicos de combate à improbidade administrativa e à persecução criminal, garantindo que a norma mais favorável retroaja em favor do réu. Os ministros Dias Toffoli, Nunes Marques e André Mendonça acompanharam o entendimento de Gilmar Mendes, formando a maioria na decisão da 1ª Turma do STF.
Crédito: Nelson Jr./SCO/STF