Reflexões sobre o Dia da Igualdade Feminina

No Brasil, a agenda pela igualdade entre os gêneros ainda não encontra guarida dentro dos espaços público e privado. Embora se tenha traçado diversas estratégias de fomento à igualdade feminina, a consolidação material do objeto central a ser percorrido delineia-se, sobretudo, sob um campo nebuloso, em que há pouca ou qualquer evidência da concretização de seus efeitos na vida cotidiana das mulheres. Dessa maneira, neste dia 26 de agosto, em que se comemora o Dia Internacional da Igualdade Feminina, cabe fazer uma breve reflexão a respeito dos espaços de resistências e dos estigmas aos quais mulheres são submetidas diariamente em sua dupla jornada de vida.

A Carta Magna de 1988, a então vigente Constituição Federal Brasileira, dentro de seu capítulo sobre direitos e deveres individuais e coletivos, introduz no inciso I de seu artigo 5° o tratamento igualitário a ser concedido a homens e mulheres. Contudo, sabe-se que a previsão legal não nos leva a alçar voos tão distantes, haja vista que mulheres são constantemente colocadas à prova, quando não violentadas em virtude de sua condição. Não há neste momento ambições quanto ao mérito de discutir acerca da violência praticada contra o gênero feminino, cabe apenas pontuar de forma singela como esse fenômeno coloca a todo instante mulheres em posições de desprestígio, de ridicularização e porque não falar de desumanização. Essa perda de cidadania, a qual vê-se estampada todos os dias nos noticiários pelo país afora, nos leva a questionar quase que instantaneamente qual igualdade se está a falar quando tratados e convenções internacionais aos quais o Brasil é signatário, preveem em seus textos a igualdade entre os gêneros como direito humano e fundamental.

Levando a reflexão para o âmbito profissional, em especial o da Advocacia, é comum a visualização da descaracterização de mulheres a fim de integrar um padrão enraizado – infundado – na sociedade brasileira. Qualquer mulher advogada ao ser questionada sobre o ambiente jurídico a que faz parte, muito provavelmente responderá algo no sentido de ser um espaço proeminente conservador e machista, e que em razão disso, a todo momento suas posturas são questionadas. É como se a todo novo passo trilhado por uma mulher, ainda fosse necessário passar pelo crivo de avaliação de um homem para dá prosseguimento. Claro, há de se considerar todos os obstáculos superados, todos os percalços que foram deixados de lado, mas há de se considerar também, que o princípio da isonomia só pode ser observado se ele valer para todos, e não para alguns, e nesse caso, as prerrogativas concedidas aos homens inserem as mulheres em ambiente de pura utopia. Utopia porque é difícil conceber um novo Brasil quando ainda se vê na prática uma mentalidade forjada tão imbuída de preconceitos e estereótipos.

Myrthes Gomes, considerada por muitos como a primeira advogada do Brasil (há de se fazer devida menção a nossa entusiasta Esperança Garcia), em seus relatos sobre sua vida na advocacia já evidenciava este fenômeno, “Envidarei, portanto, todos os esforços, afim de não[…] deixar uma prova de incapacidade aos adversários da mulher como advogada. […] Tudo nos faltará: talento, eloquência, e até erudição, mas nunca o sentimento de justiça;” (O País, Rio de Janeiro, p. 2, 30 set. 1899). Esse retorno ao passado nos mostra claramente como a questão da igualdade dentro do âmbito jurídico é de longa data.

Por esta razão, levando em consideração todos os avanços já concretizados dentro da esfera macro de proteção aos direitos humanos das mulheres e todos os obstáculos a serem vencidos, não há porque baixar a cabeça neste momento. Muito pelo contrário, cada passo além de ser necessário, é crucial para a construção de mais um degrau na agenda de igualdade plena entre os gêneros. Se não pelas mulheres que nos deixaram, pelas que ainda estão por vim. Mulheres, uni-vos!

Naiara Moraes, advogada

Veja Também

Ser pai é Legal:Evolução dos Direitos dos Pais

Na sociedade brasileira, a força patriarcal por muito tempo não conseguiu se sobrepor à supremacia …