Procura por serviço de escuta por psicólogos durante a quarentena volta a subir em São Paulo

Francisco Nogueira, coordenador do projeto Experiência de Escuta Gratuita, afirma que houve queda de 26% na busca pelo serviço logo após o anúncio do governo de SP, mas semanas depois a recuperação já é de 9%.

anúncio de flexibilização da quarentena em São Paulo gerou uma queda na procura pelo serviço de escuta online oferecido gratuitamente por 60 profissionais, entre psicólogos e psicanalistas. De acordo com o coordenador do projeto Experiência de Escuta gratuita, Francisco Nogueira, a procura pelo serviço caiu 26% logo após o anúncio, mas teve uma recuperação de 9% desde então.

“Aqui em São Paulo tem acontecido muito, acho que por conta da reabertura da economia e do afrouxamento da quarentena, as pessoas têm procurado menos a gente e tem cancelado. Às vezes cancelamentos de última hora, ou então, cancelamentos que acontecem sem que a pessoa avise, então, o profissional fica lá esperando e a pessoa não atende. Nessa semana que teve o anúncio de que haveria uma flexibilização teve uma queda de 26%, depois a gente teve um aumento de 8% e hoje a gente está com um aumento de 1%. Então, a gente tem aí 26%, depois teve uma recuperação de 9%, ou seja, a gente está funcionando atualmente com cerca de 16% menos do que a média dos três meses”, disse Francisco.

Entretanto, apesar da queda na procura, Francisco alerta que é importante que as pessoas continuem cuidando da saúde mental e ressalta que o sofrimento psíquico gerado por conta da pandemia pode durar ou se manifestar, mesmo após o encerramento do período de quarentena.

“Eu tenho certeza que vai gerar [sequelas] a gente sabe que tem um tempo médio aí de três anos de consequências graves que a gente pode enfrentar. A gente tem feito escutas de pessoas fazendo home office e o home office nessas condições, sem uma preparação, sem uma organização, sem um espaço adequado, bem preparado, foi tudo assim, do dia para noite, você não montou um escritório, você não organizou sua rotina, você não tem mais o apoio de alguém, as crianças não vão mais para escola, então, o que acontece é que houve uma sobrecarga e uma sobreposição de tarefas, é você ter que trabalhar o dia inteiro e ter que lavar louça, fazer comida e cuidar dos filhos, então, o que a gente tem observado é que existe uma grande parcela da população que trabalha sofrendo de stress”, afirma Francisco.

O projeto Experiência de Escuta gratuita começou a funcionar desde o início da quarentena. De acordo com o Francisco, nos últimos três meses cerca de 2 mil atendimentos já foram realizados, destes, a maioria é de mulheres (68,8%) e de cada 10 pessoas ouvidas, 7 são pessoas jovens, com idades entre 18 e 34 anos (67%). A maioria das escutas foram com pessoas que vivem no estado de São Paulo (1.205), mas a inciativa atende todo o Brasil.

“A gente já sabia que íamos ter que fazer um enfrentamento das questões de saúde mental com a chegada da pandemia no Brasil, então, quando veio o anúncio de que a gente faria a quarentena em São Paulo a gente começou a pensar o que poderíamos fazer para oferecer para a população algum tipo de suporte, então, foi a partir dessa preocupação que a gente conseguiu colocar esse serviço no ar e foi muito rápido, porque o anúncio foi feito, se eu não me engano, em uma quarta-feira, e no sábado a gente tinha gente participando, já tinha usuário acessando o site e a quarentena começou mesmo na terça-feira seguinte, então, a gente conseguiu organizar isso de uma maneira muito ágil”, afirma Francisco.

Durante as 13 primeiras semanas da quarentena, o psicanalista afirma que houve uma variação no comportamento daqueles que recorreram ao serviço. Segundo Francisco, entre as semanas 1 e 3 predominava a sensação de desespero, discursos de revolta e preocupação com o trabalho e o sustento familiar, já a partir da quarta semana começaram a surgir sentimentos de tristeza, medo de não ser produtivo e de não dar conta da casa e dos filhos. Na 6ª semana, ainda segundo Francisco, as pessoas começaram a apresentar sintomas de cansaço e saturação. A partir da 8ª semana aumentou o número o abuso de álcool e de drogas, por fim, a partir da 12ª semana os casos começaram a ficar mais graves.

“Nas últimas semanas a gente vê esse movimento que é ao mesmo tempo uma diminuição da procura e um número grande de cancelamento, e uma gravidade maior das sessões, com falas suicidas e depressões. A gente tem feito alguns encaminhamentos para psiquiatria, para psicólogos que possam acolher essas pessoas e a gente tem observado que isso é geral, tanto no estado de São Paulo, quanto fora do estado, no Brasil”, afirma Francisco.

Para acessar o serviço de escuta basta fazer um cadastro e agendar sua consulta no site do projeto. O atendimento deve ser feito com profissionais diferentes a cada semana.

Quarta onda

Na semana passada, o coordenador do Controle de Doenças do estado de São Paulo, Paulo Menezes, afirmou que o impacto do momento atual na população e, principalmente, em profissionais da saúde pode ser considerado a quarta onda da pandemia do coronavírus no estado.

“A questão da saúde mental tem sido chamada de quarta onda. Nesse gráfico a gente pode ver a onda vermelha, com aquela da pandemia de casos Covid-19, a laranja, uma segunda onda com impacto de condições que não são de Covid-19, uma terceira onda que é a implicação da interrupção do cuidado para condições crônicas, e em azul a gente vê uma linha crescente que é chamada de quarta onda, que é o impacto da pandemia na saúde mental, tanto de profissionais, principalmente, de profissionais da saúde, como da população”, afirmou Menezes na quarta-feira (18).

Gráfico com possíveis consequências da pandemia do coronavírus.  — Foto: Divulgação/Governo de SP

Gráfico com possíveis consequências da pandemia do coronavírus. — Foto: Divulgação/Governo de SP

De acordo com a gestão estadual, o impacto na saúde mental se deve a vários fatores, entre eles: distanciamento social, receio de contrair a doença, experiência de doença grave ou o luto, entre outros.

“A organização mundial da saúde tem chamado muita atenção para a importância de haver ações e investimentos nessa área. O impacto é devido a vários fatores relacionados ao distanciamento social necessário, o isolamento, confinamento, o receio de contrair a doença, a experiência de doença grave em um grande número de pessoas, a perda de entes queridos, e fatores como consumo de álcool, a área econômica tem mostrado que o consumo de álcool está aumentando nesses dias de confinamento e o impacto nos profissionais de saúde que tem que lidar com situações extremamente estressantes”, disse Menezes.

Ainda, segundo a gestão estadual, alguns cuidados estão sendo tomados para poder auxiliar a população e, principalmente, colaboradores da saúde a lidar como esse período, como, por exemplo, o atendimento a distância e a capacitação de profissionais para lidar melhor com a pandemia.

“A Secretaria de Saúde do estado trabalha, principalmente, na coordenação do programa de saúde mental que é de fato efetuado a maior parte das ações pelos municípios. Estamos trabalhando com cooperação na qualificação multiprofissional, através de uma série de ações para que os profissionais dos CAPS [Centro de Atenção Psicossocial], da atenção primária, das enfermarias, eles tenham uma capacitação para poder lidar com a pandemia o princípio da descentralização das ações já que a maior parte das ações de assistência são feitas no nível dos municípios e pelo monitoramento dessa rede de atenção psicossocial, investimento de tecnologia de cuidados a distância, isso tem sido extremamente importante, cada vez mais se utiliza dos recursos de videoconferência, por exemplo, e ações intersetoriais entre as secretarias”, afirmou Paulo Menezes.

G1

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