O Ministério Público Federal (MPF) encaminhou à Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) nota técnica em que se posiciona contra a proposta, em trâmite na agência reguladora, de substituição gradual das bulas impressas por bulas em formato digital nos medicamentos comercializados no Brasil.
No documento, o MPF defende que a adoção de bulas digitais deve ser implementada como recurso agregador de informação, e não substitutivo. O posicionamento leva em conta o elevado índice de automedicação e o atual letramento em saúde da população brasileira, além de estudos nacionais e internacionais que apontam a preferência pelo papel como meio de obtenção de informações sobre os medicamentos.
A proposta da Anvisa prevê a implementação das bulas digitais em duas fases. A primeira envolveria apenas remédios de amostras grátis, medicamentos de uso exclusivo hospitalar e medicamentos de embalagens múltiplas, como cartelas, em que a bula é distribuída mediante requerimento.
As informações seriam disponibilizadas por QR code ou ferramenta semelhante, e poderiam conter fotos, vídeos ou outros formatos de arquivo para auxílio ao entendimento. A segunda fase prevê a expansão gradual do formato para os demais medicamentos, e seria implementada após análise dos resultados da primeira.
Para o MPF, “parece lógico que o principal formato da bula venha a ser integralmente eletrônico no futuro, mas o preparo para uma transição perpassa assegurar infraestrutura e logística adequadas a fim de não alijar localidades ou grupos sociais de informação relevante”. Com isso, o órgão chama a atenção para o fato de que a transformação digital, por mais que seja uma realidade, não ocorre de maneira igualitária no país.
A nota pontua ainda a falta de universalização do acesso à Internet para diversos setores da sociedade, especialmente em áreas rurais e regiões menos desenvolvidas, que sofrem com falta de investimentos e infraestrutura. Cita ainda a ausência de alfabetização digital, que atinge principalmente os idosos, e questões socioeconômicas, como a falta de poder de compra para aquisição de pacote de dados, computadores e celulares, como fatores que podem gerar uma exclusão social capaz de privar parte vulnerável da população de informações essenciais, caso estes só estejam disponíveis no meio virtual.