Associação diz, após decreto de governador, que liberdades civis fundamentais não podem ser mitigadas ao arrepio da Constituição
A Anajure (Associação Nacional de Juristas Evangélicos) emitiu uma nota oficial, nesta terça-feira (28), em que critica o decreto do governo de Pernambuco sobre a exigência de testes negativos de Covid-19 ou de comprovantes da vacinação completa para liberar a presença de fiéis em cerimônias religiosas com mais de 300 pessoas.
Para os juristas, a decisão do governador Paulo Câmara (PSB) “incorre em grave desproporcionalidade, visto que restringe o direito fundamental à liberdade de religião ou crença ao ponto de impactar não somente o exercício da liberdade de culto, mas também o direito à objeção de consciência.”
O argumento da entidade é que existe uma parte da sociedade que se recusa ou ainda não tomou vacinas para prevenir a contaminação pelo coronavírus. “Em contextos como o atual, em que as vacinas vêm sendo produzidas em caráter emergencial, ante a urgência gerada pela proliferação do coronavírus, há parcela da população que possui algumas desconfianças quanto aos imunizantes e que, no momento, ainda não optou pela vacinação. Ademais, a própria ideia de vacinação compulsória também suscita divergências, sobretudo jurídicas”, completa.
Governador de Pernambuco, Paulo Câmara, é o autor do decreto
HÉLIA SCHEPPA/DIVULGAÇÃO
Apesar dessa alegação, a Anajure estimula a vacinação contra a covid-19 como forma de conter a pandemia. Porém, enfatiza que as liberdades individuais precisam ser respeitadas.
“A princípio, ressaltamos que a ANAJURE compreende a importância do avanço do processo de imunização da população e reconhece sua decisiva contribuição para a redução do número de internações e de mortes em consequência da Covid-19, mas entende também que as liberdades civis fundamentais não podem ser mitigadas ao arrepio da Constituição Federal e das demais leis vigentes no país”, alerta.
Os juristas da associação, baseados na Constituição Federal, dizem que existe uma concorrência e, por consequência, uma colisão entre direitos e princípios fundamentais.
“Por um lado, há o direito à saúde, consagrado no Título dos Direitos e Garantias Fundamentais de nossa Constituição, e que, na linha do conteúdo do decreto estadual, fundamenta a determinação da exigência de que os fiéis apresentem os comprovantes vacinais e/ou os resultados negativos, em celebrações religiosas com mais de 300 pessoas. Do outro lado, há o direito à liberdade de religião ou crença, protegido em diplomas diversos, como a Declaração Universal dos Direitos Humanos […]. Este engloba não apenas a possibilidade de escolher determinada confissão de fé, como também a faculdade de se portar em conformidade com os princípios adotados, inclusive, por meio do livre exercício dos cultos religiosos. Portanto, estamos diante de um conflito entre a proteção à liberdade de consciência e crença e a tutela individual e coletiva do direito à saúde”, explica.
Para a Anajure, “em casos de colisões entre direitos e princípios fundamentais, ou entre dois direitos fundamentais, a doutrina jurídica tem entendido que ‘deve-se buscar a conciliação entre eles, uma aplicação de cada qual em extensões variadas, segundo a respectiva relevância no caso concreto, sem que se tenha um dos princípios como excluído do ordenamento jurídico por irremediável contradição com o outro'”.
No caso do decreto, destaca, “a determinação de exigência dos comprovantes vacinais e/ou resultados negativos dos testes constitui restrição ao direito à liberdade religiosa, a fim de se resguardar o direito à saúde. Portanto, é preciso avaliar se satisfaz os ditames da proporcionalidade”.
Na última segunda-feira (27), o governo de Pernambuco baixou um decreto para cobrar a apresentação de testes negativos de Covid-19 ou de comprovantes da imunização completa contra a doença para liberar a presença de fiéis em cerimônias religiosas com mais de 300 pessoas.
O decreto do governo de Pernambuco prevê que a medida será regulamentada pela portaria conjunta das secretarias da Saúde e do Desenvolvimento Econômico.