Após Brazão, mais um conselheiro do TCE afastado por corrupção pede ao STF para voltar ao cargo

RIO — Decisão pelo ministro Nunes Marques, do Supremo Tribunal Federal, na última terça-feira, recoloca em evidência personagens de um escândalo recente na administração pública do Rio. Em Brasília, o ministro espachou a favor do conselheiro afastado do Tribunal de Contas do Estado (TCE) Domingos Brazão. Acusado de envolvimento em um esquema de corrupção, junto com outros quatro conselheiros, e, como eles, longe do cargo desde abril de 2017, Brazão foi beneficiado por um habeas corpus que, segundo algumas interpretações jurídicas, poderia abrir caminho para sua volta ao posto. O tema é controverso. Os conselheiros foram afastados durante a Operação Quinto Do Ouro da Polícia Federal — que investigou um esquema de pagamento de propinas em troca de decisões favoráveis no TCE para fornecedores do Estado.

Desde então, Brazão e seus quatro antigos pares no tribunal (José Maurício Nolasco, Aloysio Neves, Jonas Lopes de Carvalho e Marco Antônio Alencar) permaneceram recebendo salários. Até hoje, o Superior Tribunal de Justiça (STJ), o foro para o julgamento do processo, não concluiu a análise do caso. Ao longo de quase quatro anos, Brazão embolsou R$ 37.680,09 brutos entre salário e restituições por despesas extras, como reembolso de plano de saúde.

Os conselheiros fora do TCE receberam cerca de R$ 12,5 milhões desde 2017, segundo reportagem do RJ TV, porque a Justiça ainda não tomou uma decisão final. Após a manifestação favorável a Brazão, o advogado do conselheiro José Maurício Nolasco, André Perecamis, entrou com recurso junto a Nunes Marques pedindo para que seu cliente também seja beneficiado.

Além dos cinco integrantes da corte então em atividade, outro alvo da operação foi o ex-conselheiro Aloísio Gama de Souza. Assim como os ainda titulares do cargo, mas na condição de aposentado, ele continua a receber seus proventos. No contracheque de setembro, Aloísio Gama, fez jus a R$ 51.948,01 brutos.

Marques acolheu argumentos da defesa, com base em jurisprudência do STF, de que a demora para o STJ prejudicava Brazão. “Passados quatro anos e seis meses da imposição de medidas cautelares diversas da prisão, ainda não há a formação de culpa do ora paciente (Brazão), que sequer foi sentenciado, configurando um flagrante excesso de prazo das medidas em referência”, escreveu o ministro Nunes Marques.

No STJ, o processo está no gabinete da ministra Maria Jose Galotti e ainda não há prazo para ser julgado. O Tribunal de Contas do Estado (TCE) não se manifestou sobre a decisão.

Em meio ao impasse judicial, Aloysio Neves chegou a dar entrada no pedido de aposentadoria. No entanto, em março, o STJ determinou a suspensão do pedido, por entender que a aposentadoria do processo poderia retardar o julgamento. Ao deixar a ativa, ele perderia o foro privilegiado e o processo seria retomdo na primeira instância.

A corte estadual, composta por sete conselheiros, está incompleta desde 2017 — hoje funciona com cinco integrantes. Desses, apenas dois são titulares, nomeados após passarem por sabatina na Alerj. Três são conselheiros substitutos, servidores públicos concursados. Caso Brazão venha a reassumir, ele ocuparia a sexta vaga. Ainda restaria uma posição vazia no

Pessoas próximas a Brazão entendem que a medida seria favorável à sua recondução ao cargo. É o que enxergam quando Nunes Marques cita em seu julgamento o artigo 319 do Código de Processo Penal, que prevê nesses casos a volta ao cargo. O advogado de Brazão, Márcio Palma,preferiu não comentar a decisão. Já o STF informou que Nunes Marques só se pronuncia nos autos, enquanto o Ministério Público Federal,que ofereceu a denúncia, não se manifestou sobre a decisão.

Advogados ouvidos pelo GLOBO dizem que uma eventual retomada de Brazão não teria sido analisada por Nunes Marques:

— Em ações de habeas corpus, como a proposta pela defesa de Brazão, não cabe decidir sobre reassumir cargos públicos — diz o advogado especializado em Direito Administrativo, Adriano Barcelos Romeiro, professor da PUC-Rio. — O que cabe em decisões favoráveis em HC é a suspensão de restrições adotadas pela Justiça, se o réu não estiver preso. São exigências como não se aproximar de testemunhas, o que poderia prejudicar investigações. Ou só deixar a cidade do Rio com autorização prévia — explicou Adriano.

No entendimento de Adriano Romeiro, independentemente da decisão de Marques, Brazão poderia em tese apresentar ao Tribunal de Contas do Estado um recurso administrativo solicitando o retorno ao cargo. Somente se o pedido fosse negado— não há prazo para o TCE apreciá-lo —, caberia uma ação judicial pela reintegração.

Perecamis, advogado de Nolasco, também afastado pela operação Quinto do Ouro, disse que o objetivo do recurso em favor do seu cliente é para estender as medidas que beneficiaram Brazão. Ele ainda não está certo que a medida levaria a volta ao cargo.

Deflagrada no dia 29 de março de 2017, a operação Quinto do Ouro teve como base a delação premiada de Jonas Lopes, ex-presidente do TCE, e de seu filho. Indicado pelo ex-governador Anthony Garotinho, Lopes decidiu delatar após ser alvo de uma operação do braço da Lava-Jato no Rio, no final de 2016, após operadores ligados a empreiteiras delatarem esquemas de pagamento de propina em troca de vista grossa da corte que deveria fiscalizar os gastos do estado. Na ocasião, a conselheira Marianna Montebello, única titular não ligada a políticos, assumiu a condução dos trabalhos do TCE.

Jonas Lopes relatou o recebimento de propinas no TCE pelo menos desde 2001, e detalhou os esquemas ocorridos em sua gestão, entre 2011 e 2016, envolvendo grandes obras para a Copa do Mundo de 2014, o desvio de recursos do Fundo Especial do TCE e diferentes contratos da Secretaria estadual de Obras. Apenas na reforma do Maracanã teriam sido pagos R$ 3,4 milhões em propinas, segundo o Ministério Público Federal.

A denúncia apresentada pelo MPF só foi recebida pelo STJ mais de dois anos depois, em junho de 2019, quando os afastados se tornaram réus por organização criminosa e corrupção passiva. A movimentação mais recente no processo aconteceu no início de março, quando o relator, ministro Félix Fischer, suspendeu, a pedido do MPF, o processo de aposentadoria do conselheiro Aloysio Neves.

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