30 anos do Código de Defesa do Consumidor: uma história de luta e conscientização social nas relações de consumo

Neste mês de setembro comemora-se os 30 anos da Lei nº 8.078/1990, ou como é famigeradamente conhecida, o Código de Defesa do Consumidor – CDC. Tendo em vista a sua principal finalidade, é de salutar importância rememorar e enaltecer o seu papel enquanto construtor de uma consciência social ampla em relação aos direitos dos consumidores. À vista desse escopo, refletir-se-á um pouco sobre seus aspectos, desde sua origem até os dias atuais, em que se vive a era do comércio eletrônico.

As relações de consumo, assim como são conhecidas hoje, têm sua origem nas primeiras formas de interação entre aqueles que, movidos pelas necessidades sociais, ofereciam produtos e serviços, e aqueles que os consumiam. No entanto, conforme foi crescendo a complexidade dessas relações, a ocorrência de problemas e conflitos tornou-se cada vez mais intensa, ao mesmo tempo em que as injustiças e o aumento da vulnerabilidade dos consumidores também cresceram.

Foi, portanto, com o intuito de suprir as lacunas legais que contribuíam para a negligência da parte mais fraca da relação consumerista, e o de viabilizar a consolidação da tutela dessas pessoas no ordenamento brasileiro, que o CDC foi criado. Por essa necessidade urgente, aliada à insuficiência do Código Civil – CC para lidar com a matéria, foi que ele se tornou o mais importante instrumento de proteção ao consumidor já editado na legislação pátria.

Antes de qualquer avanço, vale lembrar que o dispositivo foi inspirado em um longo movimento de solidificação de direitos de proteção dos consumidores, o qual teve bases ainda no século XIX. No meio desse emaranhado de atos e legislações insurgentes, ressalte-se a carta de John F. Kennedy ao Congresso americano, em 1962, na qual ele bradou que “todos nós somos consumidores”, fazendo assim um apelo aos congressistas da época para fossem reconhecidos os devidos direitos de proteção ao enorme aglomerado de consumidores daquele país.

Vê-se, deste modo, que a decisão de regular autonomamente as relações entre consumidores e fornecedores no Brasil foi relativamente tardia. Isto porque a Europa como um todo também já estava implementando políticas de tutela ao consumidor. Apesar disso, a criação do CDC foi admitida com bons olhos, tanto por parte dos parlamentares, como por parte da sociedade em geral, mesmo porque a sua edição já era um mandamento da novíssima Constituição Federal, o que também fazia parte da política de redemocratização.

Por conseguinte, foi a primeira vez no país que pôde-se ver a criação de uma norma que salvaguardasse direitos natos aos que consumidores, haja vista que se encontram em um estado de sujeição infinitamente maior dentro da relação consumerista. Tanto é que o próprio código reconheceu a vulnerabilidade do consumidor no mercado de consumo (art. 4º, I). Assim, são estabelecidas como garantias básicas o direito à proteção contra riscos no fornecimento de produtos e serviços, o direito à informação, o direito à modificação de cláusulas desproporcionais e excessivamente onerosas, o direito à efetiva prevenção e reparação de danos morais e patrimoniais (art. 6º), e outros direitos, que inclusive não estão contidos no dispositivo.

Neste contexto, percebe-se que a sociedade civil passou também a entender a utilidade dessa norma. Atualmente, para uma extensa maioria dos brasileiros, é de pleno conhecimento que há uma lei de proteção aos consumidores, e que por ela há a materialização de direitos e vedações contra práticas abusivas e fraudulentas dos fornecedores. Isto foi auxiliado pela fundação do Programa de Proteção e Defesa do Consumidor – PROCON, que desde sua criação tem atuado incessantemente na informação e conscientização das pessoas em geral.

Outro fator social de mudança provocado pelo CDC foi a adequação de condutas quando da fabricação, conservação, distribuição, oferta e entrega de produtos ou serviços. Antes, pela falta legislativa de um padrão condizente com a saúde e bem-estar dos consumidores, qualquer lesão cometida era litigada de acordo com Código Civil, o que dava azo a várias arbitrariedades, assim como a manutenção de condutas ilícitas. Ainda, a implementação da norma influenciou até mesmo os aspectos econômicos e de lucro das empresas e fornecedores, já que a prática reiterada dessas condutas provoca um distanciamento do público-alvo, o que se reflete na perda de capital.

Por fim, vale dizer que, desde a criação do código, o mundo passou por transformações significativas, principalmente na área da tecnologia de informação. O advento e ulterior desenvolvimento da internet originou uma série de mudanças no seio das relações consumeristas, especialmente no que diz respeito ao comércio eletrônico – veja-se, por exemplo, a explosão de produtos e serviços sendo oferecidos pelas redes sociais nos últimos anos. Logo, observa-se a urgência de adequação desse dispositivo a esses novos ditames sociais, que agora passam a nortear as relações entre consumidores e fornecedores.

Em todo o caso, é de sapiência geral o entendimento de que o CDC ainda possui importância fundamental no cenário do ordenamento jurídico pátrio. É por ele que várias situações de violação ao bem-estar, à integridade e à saúde dos consumidores são reprimidas. E, por isso, cabe salientar o encorajamento destes à busca pela garantia de seus direitos, pois, reiterando o que diz a norma, deve ser reconhecida a sua vulnerabilidade perante o voraz mercado de consumo.

 

 Anderson Ferreira

Advogado

 

 

 

 

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