1º cego a fazer sustentação oral no STJ defende tese de doutorado na Espanha

O advogado Cláudio de Castro Panoeiro, da Advocacia-Geral da União, irá defender sua tese de doutorado pela Universidade de Salamanca, na Espanha, nesta sexta-feira (17/1). “Doutor em superação”, como foi definido por um jornal espanhol, Cláudio foi a primeira pessoa cega a fazer, em 2010, uma sustentação oral no Superior Tribunal de Justiça.

O advogado, que atua na Coordenação de Defesa da Probidade Administrativa da Procuradoria Regional da União da 2ª Região, no Rio de Janeiro, estuda o desvio de recursos públicos nas obras dos Jogos Olímpicos de 2016, que ocorreram no Brasil.

Com o título “Transparência e integridade em grandes eventos desportivos: Lições aprendidas na Rio 2016”, Cláudio analisou os mecanismos de transparência governamentais para prevenir condutas irregulares.

Sua conclusão é a de que a corrupção é um grande problema que atinge todas as edições das Olimpíadas, não importando se foram realizadas em países desenvolvidos ou em desenvolvimento.

A tese do advogado da União também mostra que, no caso do Brasil, a legislação apresenta lacunas que propiciam irregularidades envolvendo recursos públicos.

Por isso, ele propõe um sistema de transparência mais eficiente. Em sua opinião, seriam necessárias alterações na legislação. “Ao voltar ao Brasil, vou me dedicar a redigir um documento sugerindo as alterações ou a criação de um grupo de estudo para que outras pessoas possam contribuir com o debate”, afirma.

Retinose pigmentar
Cláudio nasceu com uma doença autoimune e degenerativa da retina chamada retinose pigmentar. O problema começou a se manifestar quando ele ainda tinha dois anos de idade. Aos 17, Cláudio já não enxergava mais.

Ele estudou em uma escola convencional do Rio de Janeiro até os 10 anos. Em seguida, foi para o Instituto Benjamin Constant, onde aprendeu braile e ficou até o fim do ensino fundamental. Cursou o ensino médio no Colégio Pedro 2º e, em 1999, fez sua graduação em Direito na Universidade Federal do Rio de Janeiro.

O advogado afirma que a tecnologia foi um dos grandes instrumentos que o ajudaram a superar a falta de visão. Foi assim com o doutorado, conta. Enquanto produzia sua tese, utilizou programas de computador que transformam texto em áudio. “Minha tese é 99% em cima de livros eletrônicos”, diz.

Sustentação oral no STJ
No dia 14 de abril de 2010, Cláudio se tornou o primeiro cego a fazer uma sustentação oral no Superior Tribunal de Justiça. Estavam presentes sua esposa, amigos da AGU e ex-professores.

Na ocasião, o advogado tinha 37 anos. “Fiquei bastante impressionado com o deslocamento dentro do tribunal. Sabia que o STJ era grande, mas não tinha noção de quanto era esse grande. Não era, na minha concepção, simplesmente grande, era enorme”, afirma.

O processo, na 1ª Seção, teve como relatora a ministra Eliana Calmon. Foi julgado um mandado de segurança, com pedido de liminar, impetrado pela empresa São Paulo Alpargatas contra ato do presidente do Conselho de Ministros da Câmara de Comércios Exterior (Camex).

“Eu estava bastante apreensivo, porque não queria esquecer nada do que tinha estudado do processo”, conta ele sobre a sustentação. “Se me preparava para uma coisa, eu não mudava pelas circunstâncias do momento, porque isso poderia gerar uma certa desorganização mental. Então, apesar de boa sustentação, eu não podia mudar uma vírgula do que tinha preparado. Não era momento pra improviso”, relembra.

Avanços
Cláudio conta que sua atuação acabou por ampliar o debate dentro da comunidade jurídica a respeito da inclusão de pessoas com deficiência.

“Após a sustentação, muitos órgãos passaram a dar maior importância à questão da acessibilidade”. O curso que ele conclui na Espanha é um dos exemplos. O doutorado está sendo feito por meio de um programa de incentivo à capacitação oferecido pela AGU.

Conjur

Veja Também

MEC fecha parcerias com a França

Foram assinados acordos para incentivar formação de profissionais de educação básica, promoção do plurilinguismo, combate …